Que a democracia seja questionada ou que, no
limite, esteja em questão não é, certamente, uma novidade do tempo presente. Na
verdade, desde os seus alvores, que remontam à civilização grega clássica, as
instituições democráticas estiveram sempre debaixo do fogo cruzado da discussão
política e do questionamento crítico. Mas, nos últimos anos, é o próprio modelo
ocidental de democracia representativa, que, apesar de ter resistido ao
desgaste e às sucessivas reelaborações durante vinte e cinco séculos, se vê agora
como alvo de desencanto e de cepticismo acelerado, a ponto de se questionarem
até as vantagens da democracia, relativamente a outras formas de organização
política da sociedade. As recentes noções de contrademocracia, postdemocracia,
democracia multidimensional, ciberdemocracia, cosmocracia, etc., cunhadas pela
teoria política contemporânea, manifestam tal cepticismo.Por outro lado, os
fenómenos disfuncionais do avanço do populismo político, da crise das “dívidas
soberanas”, do abstencionismo eleitoral e desfiliação política, da tentação da
tirania das maiorias, da cativação da democracia por corporações e grupos de
interesses (que buscam benefícios particulares sobrepostos ao bem comum e
geral), da tendência dos governos a excederem-se em promessas que não poderão
cumprir (criando expectativas e direitos que não podem pagar), dos movimentos
de cidadãos indignados (que reclamam igualdade e justiça social), constituem,
entre outros, mais do que sinais de degradação das instituições democráticas, a
evidência de uma crise profunda da própria democracia. Ora, os períodos de
crise são também ocasiões propícias para voltar a pensar os fundamentos da
realidade em crise – e, neste caso, da democracia –, para que ela se volte a
reinventar e a redefinir, face aos desafios com que se vê agudamente
confrontada. No seguimento do que já se fez no fascículo anterior, o presente
fascículo tem por objectivo continuar a promover a discussão crítica, em
extensões diversas, de aspectos fundamentais da democracia.
ARTIGOS:
Álvaro Balsas, ‘Apresentação. Política e Filosofia II: A Democracia em
Questão’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 9–14, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0009
João de Almeida Santos, ‘Crise da Representação ou Mudança de Paradigma?
Democracia, Deliberação e Decisão’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 15–48, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0015
Roberto Merrill, ‘Democracia de Proprietários, Justiça Pré-distributiva e
Rendimento Básico Incondicional’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 49–62, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0049
Tarcísio Amorim Carvalho, ‘Religious Language and Political Legitimacy: A Moral
Theory of Multicultural Engagement’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 63–86, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0063
João Tiago Gouveia, ‘A Colonização da Democracia pelo Sistema: Partindo de um
Olhar Habermasiano’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 87–100, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0087
Manuel Lencastre Cardoso, ‘Pratiques chrétiennes pour le vivre-ensemble dans des
démocraties plurielles, l’Église et l’État selon Augustin’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 101–32, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0101
Celso Candido de Azambuja, ‘A República Aristocrática Feminista Cibernética:
Liberdade e Poder na Sociedade Tecnocientífica Complexa’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 133–58, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0133
Ricardo Tavares da Silva, ‘O Modo de Selecção dos Representantes Legislativos’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 159–90, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0159
Albano Pina, ‘A Figura do Refugiado na Democracia Contemporânea’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 191–208, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0191
Cláudia Maria Rocha de Oliveira, ‘Pessoa e Sociedade: o Chamado ao Existir Pessoal
Compreendido como Apelo à Esperança a partir da Filosofia de Henrique Cláudio
de Lima Vaz’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 209–38, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0209
Cristina Foroni Consani and Joel Thiago Klein,
‘Democracia, Deliberação e Discussão na Filosofia Política de Rousseau’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 239–66, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0239
Vânia Cossetin, ‘Ação e Linguagem: Política e Sociabilidade na
Fenomenologia do Espírito de Hegel’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 267–86, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0267
John Paolo Juliano, ‘A Crippled Democracy: Nietzsche and the Philippine
Social Order’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 287–304, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0287
Daniel Gomes and Maurício Guedes,
‘“Self Pontual”, Democracia e Ética da Autenticidade’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 305–22, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0305
María Carla Galfione, ‘Derivas Políticas de la “Filosofía Científica” en la
Obra de Rodolfo Rivarola’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 323–48, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0323
Lior
Rabi,
‘The Imperative of Individuality, Vocation of Man and the End of Metaphysics in
Modern Times’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 351–78, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0351
Edgard José Jorge Filho, ‘Kant e os Deveres para com as Gerações Futuras’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 379–404, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0379
Maria José Varandas, ‘A Percepção Estética da Natureza: Encontro, Presença e
Liberdade’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 405–16, DOI .17990/rpf/2017_73_1_0405
Jaison
Schinaider, ‘Book Review - Geach, Peter Thomas. Razão
e argumentação. Trad. Clarissa Vido, Gustavo Coelho e Luis Fellipe Garcia.
Porto Alegre: Penso, 2013.’, Revista Portuguesa de Filosofia 73, no. 1 (2017): 419–22, DOI .17990/rpf/2017_73_1_041
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